26.2.07

Confidência



Eu deixarei que morra em mim o desejo de amar os teus olhos que são doces
Porque nada te poderei dar senão a mágoa de me veres eternamente exausta.
No entanto a tua presença é qualquer coisa como a luz e a vida
E eu sinto que em meu gesto existe o teu gesto e em minha voz a tua voz.
Não te quero ter porque em meu ser tudo estaria terminado
Quero só que surjas em mim como a fé nos desesperados
Para que eu possa levar uma gota de orvalho nesta terra amaldiçoada
Que ficou sobre a minha carne como uma nódoa do passado.
Eu deixarei... tu irás e encostarás a tua face em outra face
Teus dedos enlaçarão outros dedos e tu desabrocharás para a madrugada
Mas tu não saberás que quem te colheu fui eu, porque eu fui o grande íntimo da noite
Porque eu encostei minha face na face da noite e ouvi a tua fala amorosa
Porque meus dedos enlaçaram os dedos da névoa suspensos no espaço
E eu trouxe até mim a misteriosa essência do teu abandono desordenado.
Eu ficarei só como os veleiros nos portos silenciosos
Mas eu te possuirei mais que ninguém porque poderei partir
E todas as lamentações do mar, do vento, do céu, das aves, das estrelas
Serão a tua voz presente, a tua voz ausente, a tua voz serenizada.

(Ausência, V.M - adaptado)



Quando me faltam palavras, costumo comparar certas coisas ao fado - e quem me conhece sabe o que isso significa.
Esse poema penetrou minha íris como um bom fado a dedilhar seus doces acordes em meus tímpanos. Ambos me fazem acordar para uma realidade onde é difícil crer em sentimentos difíceis. Meu pouco de felicidade soa mais seguro do que a exacerbação afortunada que determinadas situações provocam de tempos em tempos. Eu não costumo mais ceder as mesmas, pois receio magoar outro coração por ser quem sou.

No fim, esse poema é o que me restará. Ele, o fado e a solidão sadia e conhecida que me representa.